Moeda Social

Outro dia estava assistindo televisão, ou foi lendo uma revista, e vi uma reportagem sobre "moeda social", um dinheiro criado por um pessoal, mas que só valia ali, na localidade em que moravam. Perguntei a Niltinho, pois é assunto que tem a ver com o trabalho dele, e ele me explicou mais ou menos o que era.

É como eu pensava, isto já tinha sido inventado lá em Ubiraçaba.

Seu Abias Azevedo, irmão de Seu Armindo, ex-prefeito de Brumado, quando faleceu era um homem de muitas propriedades, terras, lojas, um homem rico, como se diz. Mas antes de ter loja grande em Brumado negociou em muitas praças da região, inclusive em Ubiraçaba, onde se passou esta história.

Ele mexia principalmente com tecidos. Tinha uma boa freguesia, mas o que faltava muitas vezes era o troco. Dinheiro miúdo prá dar de troco nas compras que o povo fazia. Então, prá resolver este problema, ele apresentou uma solução que foi aceita por todos por ser ele uma pessoa muito considerada.

Mandou imprimir num papelão o nome da firma e o termo "VALE". Num espaço em branco ele escrevia o valor que assumia como dívida. Aquele vale servia também no comércio e na feira, tamanha era a confiança que as pessoas tinham no negociante. Ele tinha crédito. A qualquer momento, havendo troco, o cidadão possuidor do vale poderia resgatar o "título", ou usá-lo numa próxima compra. Era uma espécie de "conta-corrente", ao contrário. Ou seja quem ficava devendo era o vendedor. Como era uma pessoa que todos acreditavam, não dava problema.

Em certa oportunidade, Lolô, nome de batismo Jerulino, filho de Dona Maria Poteteira, foi ao comércio e encomendou na Loja de Seu Abias uma fazenda de tecido para costurar um terno. Muitos o tinham como um sujeito meio bôbo, sem noção das coisas, mas naquele dia ele saiu com uma novidade.

Feito o corte de seis metros do tecido, aprontado o embrulho para ser levado ao alfaiate, ele prontamente tomou um lápis e num pedaço de papel escreveu: Vale tanto - o correspondente ao valor do produto, e assinou. O balconista, assustado, meio gaguejando disse que não poderia receber daquela forma, ficou sem saber como tratar a situação. Correu prá chamar Seu Abias e saber como proceder.

"Como vai Lolô? Dona Maria vai bem?", chegou de mansinho Seu Abias.

"É que ele não quer receber meu Vale", foi logo ao assunto, Lolô.

Paciente, o comerciante informa "olha, aqui nós fornecemos o vale só quando não temos troco para dar ao cliente".

E Lolô arrematou: "Vocês dão vale quando não tem troco, e eu dou quando não tenho dinheiro".

E agora? Assim é que digo que Seu Abias criou uma espécie de moeda social. Lolô, até que tentou.

Nenhum comentário:

Postagem em destaque