As caçambas de prata


Osório contava muitas histórias sobre seu pai, Faustino, ou  Dôzinho como era conhecido. Seu filho, Nilton, ouvia com muita atenção cada detalhe e aprendeu a contar para a família estas histórias e outros tantos "causos".

Consta que a partir dos anos novecentos, Dôzinho, que se locomovia  geralmente a cavalo, passou a usar para apoiar os pés quando montado, um estribo de madeira. O cavalo podia ser o melhor, a sela novinha, mas o estribo era o mais simplório que arranjou.

Não o fazia por um motivo qualquer, mas para que as pessoas ao observarem aquele acessório rudimentar  procurassem saber o motivo. Era dito e certo: "Sr. Faustino, desculpe perguntar, mas é que o Sr. é um homem tão distinto, anda sempre bem apresentado, uma sela bem aprumada. O Sr. me diga: por quê usa um estribo de pau?"

Era a deixa que ele queria, para contar a todos o que lhe sucedera. Acontece que seu sogro, então já falecido, Capitão Wenceslau Risério de Araújo, ainda em vida, lhe concedera o direito de usar um estribo vistoso, caçambas de prata muito bonitas, e que usava com muito gosto. 

Ocorre que no curso do inventário, como não poderia deixar de ser, o par de caçambas foi arrolado como um dos bens do falecido. Até aí, tudo bem. Porém, um dos filhos do inventariado - ele não dizia qual, mesmo sabendo que o acessório era usado por Faustino, "não tomou conhecimento" e fez questão que integrasse a sua parte da herança. Dôzinho também era herdeiro, pois sua falecida Camila era filha, sendo seu esposo, assim como  os filhos, teria direito a sua parte.

Assim pensava Dôzinho. Se o Capitão Wenceslau em vida deixara que usasse as caçambas, o natural é que permanecessem sob os seus cuidados, agora como herança. Daí a mágoa, que não só não escondia, mas que gostava de dar amplo conhecimento.

De fato, no inventário de Wenceslau, falecido em agosto de 1899, consta um par de caçambas de "metal branco" com valor estimado em 20 mil réis. Metal branco é designação utilizada para a "alpaca", uma liga de cobre, zinco e níquel, também conhecida como prata alemã, por sua semelhança com a prata. Pois, se Dôzinho só contava o milagre e não informava o "santo", no inventario, está anotado entre parênteses aquele que foi provável beneficiário: Theódulo, um dos filhos de Wenceslau e Constança.

Março/2013

Nenhum comentário:

Postagem em destaque